quinta-feira, 29 de julho de 2010

Arena Dragão do Mar: Você faz o som

FOTOS MARINA CAVALCANTE
Por Yuri Tavares

É tiro e queda. Das horas mais sonolentas pela manhã aos horários “de pico” pela noite, quando a movimentação das múltiplas linguagens, do público interessado ou mesmo dos transeuntes distraídos assume ares de agente de ocupação, a Arena Dragão do Mar, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, vive a constante de se tornar um espaço de múltiplos sons - nem sempre convencionais e às vezes caóticos -, como em uma sinfonia que não necessita de formalidade rítmica, nem mesmo de profissionais “letrados” da música para dela realizar execução.

A causa, ou o que poderíamos denominar de meio, para tamanha fertilidade de sons que toma conta dos arredores do espaço se faz justificar pela presença de quatro esculturas sonoras, ou “terminais sonoros” (com direito a placa indicativa e manual de uso), construídos com materiais diversos e inusitados, entre sucatas, canos e outros tipos de quinquilharias inicialmente dispensáveis.

Presentes no espaço desde março deste ano, época em que o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura se viu invadido pelos “tambores digitais” do evento Teia Brasil 2010, as esculturas sonoras têm assinatura do artista Narcélio Grud, que em tempos não muito longínquos andou chamando a atenção dos fortalezenses por fazer brotar “cabeças" coloridas e sorridentes da noite para o dia, em meio ao cinza das calçadas. Assim como essas intervenções do espaço urbano, as esculturas (institucionalizadas) sonoras são sucesso com o público do Centro Dragão do Mar, que, independente da idade ou da falta de habilidade para a execução formal de instrumentos musicais, se arrisca a interagir das mais diversas maneiras com as obras, inclusive quebrando-as.

Em entrevista por e-mail, Narcélio falou um pouco sobre o projeto, seu conceito e sua concepção, montagem e a repercussão com o público que frequenta o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.


Dragão do Mar - Como surgiu a ideia para a concepção do trabalho?
Narcélio Grud: (O trabalho surgiu) a partir do direcionamento que venho procurando dar ao meu trabalho artístico, quanto à sua utilização e sua adequação pública, e dentro de uma linha de pesquisa que desenvolvo com Esculturas Sonoras, veio a ideia de criar tais objetos. Procurei usar uma linguagem já existente na rua, que não trouxesse tanta informação a mais do que a existente, daí utilizei os suportes e as simbologias usadas nas placas de sinalização de trânsito.


Dragão do Mar - Qual a proposta ou conceito trabalhado?
Grud: A proposta do trabalho é dispor para livre acesso da população a utilização de bens culturais, ferramentas do fazer artístico e até um meio de entretenimento mais "saudável". O conceito é de transformar espaços e obras artísticas públicas em objetos e ambientes com maior interação, que possam trazer além das estéticas, funcionalidades...


Dragão do Mar - Como se deu o processo de criação/montagem/construção das esculturas sonoras? Houve alguma delas que sofreu transformações no decorrer da criação?
Grud: O processo de criação se desenvolveu a partir da prática do pensar artístico e da observação do ambiente público, identificando meios de adaptação e de sensibilização através de uma linguagem plástica e sonora que é a da escultura sonora... Resignificando símbolos e readaptando instrumentos musicais e esculturas sonoras a uma melhor disposição quanto a sua utilização do suporte de sinalização existente... Há também outros projetos concebidos, mas que ainda não foram postos em prática, com esta mesma finalidade. O processo se deu em principio com um projeto desenhado à mão, que posteriormente adeqüei às formas projetuais com linguagens técnicas, pensando em uma possível construção em série... Até agora foram desenvolvidos nove modelos, dos quais cinco foram produzidos, dentre estes, alguns foram readaptados da sua forma original de concepção a uma forma melhor adaptada aos materiais, que foram identificados no decorrer do processo de construção.




Dragão do Mar - E a sonoridades dos instrumentos, como vocês as classifica? Foram pensados para seguir uma estrutura tradicional de sonoridade ou a base é a experimentação?
Grud: A sonoridade dos "instrumentos públicos" (o certo seria chamar de esculturas sonoras públicas, mas pra uma melhor compreensão do público, designo de tal forma) segue tanto a linha convencional dos instrumentos musicais existentes quanto a pesquisa que procura desenvolver outras formas de pensar e sentir o som. Como todo este projeto, coisas foram concebidas anteriormente e outras foram se adaptando e sendo melhoradas na sua construção... Uma questão sonora que estou implantando e readaptando atualmente a este trabalho é de uma linha de pesquisa acadêmica de estudo musical chamada musicoterapia. Esta dispõe de uma paleta sonora identificada de sons, notas, acordes que trazem a quem escuta e a quem estiver manuseando as esculturas um bem à saúde física e mental, como é o caso do Afinador de Chacras, um dos expostos atualmente no Dragão do Mar. A escultura dispõe de sete barras de alumínio maciço dispostas cada uma em uma altura aproximada dos chacras no corpo humano (procurei manter uma altura padrão de 1.65m como base do arquétipo físico local). Estas barras, quando percurtidas, emitem uma sonoridade que regula a afinação de cada um, proporcionando uma regulação energética, a qual propicia, de acordo com estudos, inúmeros benefícios à saúde... Esta ação é uma das quais estou procurando unir a estas obras.


Dragão do Mar - Como você avalia a resposta do público que freqüenta o Centro Dragão do Mar ao seu trabalho, através da interatividade e até de danos aos instrumentos?
Grud: Tenho observado com alegria o impacto que estas obras trazem ao público, de crianças a idosos, todos interagem. As manifestações são diversas e na maioria são de surpresa... Acho que o público necessita de obras que lhe permitam a ação direta, não simplesmente a contemplação... que possam fazer parte do seu dia-a-dia como objeto de inclusão, de ser participativo. O desgaste desta manipulação em massa era esperada. Vejo isto nos alambrados das quadras esportivas de espaços públicos e em diversos outros mobiliários urbanos. É interessante esta disposição no Centro Dragão do Mar, porque pode me dar condição de realizar algumas melhorias quanto às formas de disposição e aos materiais a serem utilizados, como um pequeno manual do usuário fixado em cada um, dando um direcionamento para a melhor forma de uso. Agora estou desenvolvendo um manual, uma cartilha para que os equipamentos que adquirirem essas obras possam fazer a manutenção e qualquer conserto que seja preciso realizar... A idéia é que essa obra se propague e ocupe as ruas, as praças, as escolas, o mundo...



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